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Sentença afasta voto de qualidade do CARF e cancela crédito tributário

29 de Junho, 2016



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A 8ª Vara Federal de Campinas (SP) proferiu, nos autos do Mandado de Segurança nº 0013044-60.2015.403.6105, importante decisão para uma montadora de veículos que pode fazer com que os contribuintes aprofundem perante o Poder Judiciário uma discussão que, doutrinariamente, já vem sendo debatida há algum tempo: a adoção do chamado voto de qualidade para desempatar julgamentos nos processos administrativo-fiscais, em especial perante o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).

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No CARF, quando um julgamento está empatado, inclusive na Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) – órgão máximo desse Tribunal Administrativo -, cabe ao presidente da turma julgadora desempatar a votação, proferindo o referido voto de qualidade. Todavia, os questionamentos surgem na medida em que os presidentes das turmas são, por força da aplicação da legislação vigente, sempre conselheiros indicados pela Fazenda Nacional.

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Em levantamento realizado por escritórios de advocacia que também militam na CARF, há casos em que, de um total de 110 acórdãos cuja discussão foi resolvida pelo voto de qualidade, os contribuintes perderam 95% das vezes.

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Em outro levantamento em que foram analisadas decisões apenas da CSRF, de 1.050 acórdãos verificados, 370 deles foram julgados pelo voto de qualidade, sendo que os contribuintes venceram somente em 6 casos.

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Além da violação ao princípio da igualdade, que deve nortear os julgamentos administrativos e judiciais, a questão em debate ainda reserva outras discussões relevantes. No caso específico da montadora, a matéria de mérito discutida no processo administrativo foi a incidência ou não do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) – Importação sobre remessas de royalties para o exterior, decorrentes de contratos de transferência de tecnologia.

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Em suma, o Fisco entendeu se tratar de contratos de assistência técnica e prestação de serviços, cuja remuneração é considerada importação e, consequentemente, é tributada pelas citadas contribuições. Por outro lado, o contribuinte defendeu que, por se tratar efetivamente de contratos de transferência de tecnologia, não haveria que se falar em remuneração por serviços prestados, mas sim em royalties, ou seja, não teria havido importação de serviços tributável pelo PIS e COFINS-Importação.

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Ocorre, todavia, que na discussão administrativa o julgamento ficou empatado em três votos a favor do contribuinte e três contra, sendo que foi o voto de qualidade do conselheiro presidente que decretou a derrota da empresa. O contribuinte chegou a recorrer à CSRF, mas não teve seu recurso admitido para julgamento, o que o motivou a levar a matéria para apreciação do Poder Judiciário.

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Em sua sentença, o juiz Raul Mariano Jr., acatando argumento do contribuinte, entendeu que, no caso de empate na discussão administrativa, a questão deveria ter sido analisada a luz do art. 112, do Código Tributário Nacional (CTN), que disciplina que, em se tratando de aplicação de penalidade, a interpretação deve ser favorável ao contribuinte:

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“Contudo, me parece que tal norma deveria ser interpretada conforme aquela já mencionada, prevista no art. 112 do CTN. A dúvida objetiva sobre a interpretação do fato jurídico tributário, por força da Lei de normas gerais, não poderia ser resolvida por voto de qualidade, em desfavor do contribuinte. Ao verificar o empate, a turma deveria proclamar o resultado do julgamento em favor do contribuinte.”

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Cumpre lembrar que em recente julgamento pelo STF, no caso do mensalão (ACP nº 470), o tribunal entendeu que no empate, a decisão deve ser interpretada de forma mais favorável ao acusado, o que fez com que, na hipótese, eles fossem inocentados. O entendimento refletido na decisão da Justiça Federal de Campinas segue a mesma linha, até mesmo porque o CTN, em seu art. 112, traz exatamente o mesmo comando presente no direito penal, quer dizer, em caso de dúvida na aplicação da sanção, deve-se interpretar a favor do contribuinte.

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A decisão, portanto, representa importante fundamento para que a questão do voto de qualidade possa ser discutida de forma mais contundente perante o Poder Judiciário, por qualquer contribuinte que se sentir prejudicado na tramitação administrativa do crédito tributário.