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Execução de crédito com garantia real e a preferência da penhora 

27 de Setembro, 2023



De acordo com o Código de Processo Civil brasileiro, “na execução de crédito com garantia real, a penhora recairá sobre a coisa dada em garantia, e, se a coisa pertencer a terceiro garantidor, este também será intimado da penhora” (§ 3º, art. 835). Analisando o citado artigo de forma superficial, constata-se que, em se tratando de demanda judicial, a preferência é justamente à penhora da coisa dada em garantia, independentemente de esta ser de propriedade do devedor principal, solidário ou de terceiro garantidor. 

Contudo, o caput do art. 835 dispõe que a penhora observará preferencialmente a seguinte ordem: “I – dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira; II – títulos da dívida pública da União, dos Estados e do Distrito Federal com cotação em mercado; III – títulos e valores mobiliários com cotação em mercado; IV – veículos de via terrestre; V – bens imóveis; VI – bens móveis em geral; VII – semoventes; VIII – navios e aeronaves; IX – ações e quotas de sociedades simples e empresárias; X – percentual do faturamento de empresa devedora; XI – pedras e metais preciosos; XII – direitos aquisitivos derivados de promessa de compra e venda e de alienação fiduciária em garantia; XIII – outros direitos”. 

Destaca-se, ainda, que o § 1º do artigo em questão estabelece que a penhora em dinheiro é prioritária, mas faculta ao juiz alterar a ordem de preferência entre as demais hipóteses – o que inclui a do § 3º. Desse modo, é importante interpretar a regra levando em conta a ressalva do § 1º, de modo a verificar se a penhora sobre o próprio bem dado em garantia é preferencial e se, consoante o caso, o exequente pode abrir mão dela em prol de outros bens que se mostrem mais eficientes, não obstante a preferência na ordem de pagamento que lhe é assegurada pelo art. 1.422 do Código Civil. 

Com isso, pode-se constatar que a ordem de penhora prevista em lei é preferencial – e não obrigatória. Deve-se, portanto, observar o princípio da menor onerosidade para o devedor e considerar as questões do caso concreto, a fim de resguardar os direitos do exequente e a satisfação de seu crédito. Vale registrar que este também é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, relativando a regra do § 3º sobreos bens a serem penhorados: 

“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. PENHORA. BEM DADO EM GARANTIA. AFASTAMENTO. POSSIBILIDADE. SATISFAÇÃO DO CRÉDITO. APRECIAÇÃO DE TODAS AS QUESTÕES RELEVANTES DA LIDE PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. AUSÊNCIA DE AFRONTA AO ART. 1.022 DO CPC/2015. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. SÚMULA N. 283/STF. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INADMISSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7/STJ. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADA. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA. DECISÃO MANTIDA.

  1. Inexiste afronta ao art. 1.022 do CPC/2015 quando o acórdão recorrido pronuncia-se, de forma clara e suficiente, acerca das questões suscitadas nos autos, manifestando-se sobre todos os argumentos que, em tese, poderiam infirmar a conclusão adotada pelo Juízo.
  2. O recurso especial que não impugna fundamento do acórdão recorrido suficiente para mantê-lo não deve ser admitido, a teor da Súmula n. 283/STF. 
  3. ‘No tocante ao malferimento do artigo 835, § 3º, do CPC (correspondente ao artigo 655, § 1º, do CPC/73), a jurisprudência desta Corte Superior firmou-se no sentido de que a preferência é relativa, devendo ser afastada tal regra quando constatada situação excepcional, notadamente se o bem dado em garantia real se apresenta impróprio ou insuficiente para a satisfação do crédito da parte exequente’ (AgInt no REsp n. 1.778.230/DF, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 11/11/2019, DJe 19/11/2019). 
  4. O recurso especial não comporta exame de questões que impliquem revolvimento do contexto fático-probatório dos autos (Súmula n. 7 do STJ). 
  5. No caso concreto, o Tribunal de origem concluiu pela possibilidade de penhora de bens diversos, conforme for mais conveniente à efetividade da execução. Alterar esse entendimento demandaria o reexame das provas produzidas nos autos, o que é vedado em recurso especial. 
  6. O conhecimento do recurso especial interposto com fundamento na alínea ‘c’ do permissivo constitucional exige a demonstração da similitude fática entre os acórdãos confrontados. 
  7. Agravo interno a que se nega provimento.” (AgInt no AREsp n. 1.544.669/SP, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 14/3/2022, DJe de 18/3/2022) 

Portanto, havendo execução de crédito com garantia real, a penhora poderá recair sobre bens além daqueles dados em garantia pelo executado, desde que demonstrado ser a constrição mais recomendável. O processo executório deve ser observado concomitantemente para dar maior efetividade ao processo executivo, tendo em vista o direito do credor e o princípio da menor onerosidade para o devedor, objetivando uma execução equilibrada e com atos executórios proporcionais à causa. 

Autora
Lauriê Madureira Duarte  
OAB/MG 123.086 

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