Após a decisão do Supremo Tribunal Federal que, em março de 2017 (RE nº574.706 – Repercussão Geral), determinou que o ICMS não integra a Receita Bruta dos contribuintes e não pode, dessa forma, ser incluído na base de cálculo do PIS e da COFINS, várias demandas judiciais foram apresentadas visando à exclusão desse imposto da base de cálculo de outros tributos que também têm a receita bruta como base tributável.
Nesse mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça, se alinhando ao posicionamento da Corte Suprema, entendeu que o ICMS não faz parte do patrimônio da pessoa jurídica, mas sim do Estado, tendo o contribuinte apenas a posse dos valores de ICMS que devem ser posteriormente repassados ao Estado.
Seguindo esse raciocínio, em recente entendimento proferido nos autos do HC 399.109, a 3ª seção do STJ chegou à conclusão de que o contribuinte que não repassa ao Estado o ICMS recolhido comete crime contra a ordem tributária, por apropriação indébita, uma vez que aquele montante não faz parte do seu patrimônio e sim do Estado, devendo a este ser prontamente repassado.
No entanto, utilizando-se de dois pesos e duas medidas, em flagrante prejuízo aos contribuintes, apesar de assentir que o ICMS não faz parte do patrimônio do contribuinte e sim do Estado, entendeu o mesmo Superior Tribunal que, no caso dos contribuintes que optam pelo regime do Lucro Presumido, o ICMS compõe a base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
Ora, ou o ICMS faz parte do patrimônio do contribuinte e assim será incluído em seu faturamento, fazendo parte da base de cálculo do IRPJ e CSLL, ou o ICMS não faz parte de seu patrimônio, tratando-se de riqueza pertencente ao Estado (o que enseja o crime de apropriação indébita caso não seja repassado), e, assim, não será incluído no faturamento e muito menos na base de cálculo do IRPJ e CSLL, seja a empresa optante pelo Lucro Real ou Presumido.
Diante das mencionadas decisões conflitantes, a própria Corte Cidadã (STJ) decidiu pelo julgamento em conjunto, sob o rito dos recursos repetitivos, de três Recursos Especiais (REsp nº 1.767.631/SC, 1.772.634/RS e 1.772.470/RS) que discutem a exclusão do ICMS da base de cálculo do IRPJ e CSLL apurados em regime de lucro presumido, já que em relação aos optantes pelo “Lucro Real” não há maiores discussões.
Em sua defesa, alega o Fisco Federal que a exclusão não se aplicaria aos contribuintes optantes pelo Lucro Presumido pelo fato de supostamente se tributar “apenas uma parte” da receita, uma vez que a base de cálculo do IRPJ e da CSLL nesses casos é encontrada por meio da aplicação de um percentual sobre a receita bruta, hipótese em que já estaria, pelo argumento da União Federal, supostamente deduzido o valor do ICMS pertencente aos Estados.
Argumenta, também, que a adesão à apuração no regime de lucro presumido implicaria em aceitação integral do regramento vigente, sendo que a exclusão do ICMS da base de cálculo seria “vantagem” apenas possível aos optantes da apuração pelo regime do lucro real.
Ocorre que, conforme argumentam os contribuintes, enquanto no regime tributário do “Lucro Real” há efetivas deduções no sistema de apuração, na sistemática do lucro presumido não há quaisquer deduções, mas tão somente presunções de lucro, motivo pelo qual o argumento da Fazenda não se sustentaria.
Assim, entende-se ser totalmente inadequado se falar que a exclusão do ICMS da base de cálculo seria uma “vantagem” aplicável apenas aos optantes pelo regime do Lucro Real, já que a base tributável é exatamente a mesma. Conforme já entendido pelo STF, não faz parte da receita dos contribuintes o ingresso de valor que apenas passa pela sua contabilidade, sem integrar o seu patrimônio, uma vez que o referido ingresso financeiro pertence ao Estado – independente de o contribuinte ser optante pelo Lucro Real ou Presumido.
Nesse contexto, entendemos não haver possibilidade de distinguir os contribuintes optantes pela sistemática do lucro real dos optantes pela apuração pelo Lucro Presumido, pois, embora sejam sistemas totalmente distintos, em sua essência incidem sobre a mesma materialidade (receita bruta), não podendo o seu âmbito de abrangência ultrapassar os limites constitucionalmente impostos à incidência tributária.
Sendo assim, conforme decido pelo STF no RE nº 547.706, bem como pelo STJ no HC nº 399.109, o ICMS que contabiliza o contribuinte não constitui receita de sua titularidade, não estando compreendido no conceito constitucional de receita bruta tributável.
Dessa forma, aguarda-se novo posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, nos referidos Recursos Especiais nº 1.767.631/SC, 1.772.634/RS e 1.772.470/RS, acerca da celeuma instaurada, porquanto é fundamental que o entendimento acerca da impossibilidade de exclusão do ICMS da base de cálculo do IRPJ e CSLL dos contribuintes optantes pelo Lucro Presumido seja definitivamente alinhado, pois não podem permanecer posicionamentos tão contraditórios quanto aqueles que, ao mesmo tempo em que permitem que o ICMS possa integrar a base de cálculo de tributos que incidem sobre o lucro e sobre a renda, incriminam, como se apropriação indébita fosse, a conduta dos contribuintes que não o repassam ao Estado.
A equipe da Área Tributária do escritório VK Advocacia Empresarial está à disposição para maiores esclarecimentos com relação ao assunto abordado, bem como para adoção das medidas necessárias à obtenção de provimento judicial visando à exclusão do ICMS da base de cálculo do IRPJ e CSLL das empresas que sejam optantes pelo Lucro Presumido.
Texto da advogada tributarista Juliana Campos Rocha