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ATÉ ONDE VAI A RESPONSABILIDADE DAS EMPRESAS PELA CRIAÇÃO E USO DOS GRUPOS DE TRABALHO PELO WHATSAPP

18 de Novembro, 2020



O uso do aplicativo de mensagens WhatsApp facilita a comunicação não somente na vida pessoal, mas também no ambiente de trabalho, valendo dizer que essa tecnologia foi criada para facilitar a vida das pessoas. Mas até que ponto o uso dessa ferramenta pode afetar as relações de trabalho, se compartilhadas informações que comprometem funcionários e empresas, resultando em processos trabalhistas?

É certo que o uso do WhatsApp “viralizou” no mundo todo. A tecnologia permite a troca de informações através de mensagens, arquivos de foto, vídeos e até mesmo mensagem de voz, na maioria das vezes de forma gratuita, e, quando não, a um custo bem baixo. Porém, a questão que assola as relações de trabalho é se a ofensa entre funcionários nos grupos criados no WhatsApp pelos próprios empregados, sem a ciência do empregador, gera para esse último o dever de indenização por danos morais em caso de ofensa aos participantes do grupo, todos funcionários de uma mesma empresa.

Em primeiro lugar, deve ser analisado se o grupo foi criado de forma informal, pelos próprios funcionários da empresa, sem vislumbres profissionais, apenas para trocas de informações de maneira informal, ou piadas e afins, sem que haja qualquer forma de ingerência por parte do empregador. Se sim, nesse caso não há que se falar em responsabilização do empregador, até mesmo porque o mesmo desconhece a existência do grupo. Nesse caso, havendo ofensa entre os participantes, o ofendido deverá ajuizar ação na justiça comum em desfavor do ofensor, objetivando a devida reparação civil pertinente ao caso.

Lado outro, se o grupo foi criado com caráter profissional, possuir controle por superiores hierárquicos e for considerada uma ferramenta de trabalho obrigatória, ao empregador compete fiscalizar o grupo, sendo de responsabilidade do empregador a cautela no uso do aplicativo. E nessa hipótese, em havendo ofensa por parte de superior hierárquico imediato do funcionário, é do empregador a responsabilidade pelo ato do superior, devendo a ação do ofendido ser ajuizada na Justiça do Trabalho, uma vez que o superior hierárquico e ofensor representa a empresa, hipótese em que a empresa poderá ser responsabilizada por eventuais danos causados ao funcionário, podendo ainda o caso evoluir para a possibilidade de reconhecimento de assédio moral e, consequentemente, a empresa ser condenada ao pagamento de uma indenização a título de danos morais.

Portanto, para evitar ação trabalhistas, as empresas devem tomar todos os tipos de precaução, criando regimentos internos ou manuais com normas de conduta e ética para o uso do WhatsApp como trabalho, devendo tais documentos serem levados ao conhecimento dos empregados, que deverão assinar o termo de ciência, dando ciência ao tipo de comportamento esperado e medidas cabíveis em caso de descumprimento e as punições em caso de descumprimento. E o uso do grupo deve ser exclusivo para o trabalho, e a empresa deve fiscalizar qualquer tipo de conduta ilícita, como, por exemplo, assédio moral e sexual, bem como coibir comentários difamatórios e vexatórios entre os participantes.

Lado outro, os participantes não podem esquecer que o ambiente virtual é uma reprodução do seu comportamento real e, quando o trabalho e a relação profissional estão presentes na rede social, aumenta a responsabilidade por parte de funcionários e patrões no que diz respeito à forma de se comportar e, principalmente, de tratar os colegas de trabalho, pois tudo aquilo que se faz, inclusive nos ambientes virtuais, pode ser fisgado pela Justiça caso aquilo cause prejuízo a alguém, gerando sérias consequências, já que as conversar trocadas no grupo podem ser printadas e servem como prova na instrução do processo.

Dessa forma, importante ressaltar que não é apenas o patrão que é passível de punição. Os funcionários podem ser demitidos, inclusive por justa causa, caso haja desrespeito aos gestores e demais participantes do grupo, podendo os casos de indisciplina irem parar na Justiça, já que condutas inconvenientes, atos de insubordinação ou indisciplina, ensejam demissão por justa causa, nos termos do art. 482 e incisos da CLT.

Hoje, o WhatsApp é usado no mundo inteiro, pois é uma ferramenta célere de comunicação, mas que deve ser utilizada com muito respeito entre as pessoas, não se podendo confundir grupos sociais com os grupos de trabalho. Dessa forma, principalmente nos grupos de trabalho, deve-se tratar de assuntos ligados ao labor, devendo ser evitadas brincadeiras, correntes, posicionamentos políticos, dentre outros assuntos não ligados ao trabalho, sob pena de responsabilização do ofensor. Nesse sentido, a jurisprudência dominante pontua:

COBRANÇA DE CUMPRIMENTO DE METAS FORA DO HORÁRIO DE TRABALHO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. O TRT consignou que “[a] utilização do Whatsapp para a cobrança de metas, até mesmo fora do horário de trabalho, ficou evidenciada” – pág. 478. Condutas como esta extrapolam os limites aceitáveis no exercício do poder potestativo (diretivo do trabalho dos empregados) pelo empregador, gerando ao trabalhador apreensão, insegurança e angústia. Nesse contexto, embora o Tribunal Regional tenha entendido pela ausência de ato ilícito apto a ensejar prejuízo moral ao empregado, sob o fundamento de que não havia punição para aqueles que não respondessem às mensagens de cobrança de metas, é desnecessária a prova do prejuízo imaterial, porquanto o dano moral, na espécie, é presumido (in re ipsa), pressupondo apenas a prova dos fatos, mas não do dano em si. Recurso de revista conhecido por divergência jurisprudencial e provido . fls. PROCESSO Nº TST-RR-10377-55.2017.5.03.0186 Firmado por a

ssinatura digital em 17/10/2018 pelo sistema AssineJus da Justiça do Trabalho, conforme MP 2.200 -2/2001, que instituiu a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira.

Por fim, dentro de todo esse contexto, as empresas devem atentar para que não haja o envio de informações, questionamentos ou cobranças de atividades laborais para aqueles empregados que estejam em licença, férias ou afastados do labor por qualquer razão, sendo prudente que o administrador exclua o empregado do grupo no período em que o mesmo esteja afastado, devendo o empregado ser inserido novamente no grupo profissional ao retornar para o trabalho.

Com a adoção de todas as medidas preventivas acima descritas, a empresa evitará um passivo trabalhista com relação às horas extras, adicional noturno, sobreaviso, indenização por danos morais, entre outros possíveis pedidos em uma reclamação trabalhista que tiver como um dos meios probatórios o grupo do WhatsApp, sendo certo que através das mensagens serão analisadas as condições das mensagens trocadas por meio do aplicativo, os tipos de mensagens, a exigência de resposta imediata e se tais mensagens eram habituais, dentre outros quesitos, para averiguação se o empregado realmente possui direito ao pagamento de verbas contratuais ou indenizatórias.

Por fim, importante que a empresa observe a existência de sigilo das informações que serão trafegadas pelo aplicativo, as quais são garantidas por lei, uma vez que, segundo o Art.  do Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014), todo usuário tem direito à inviolabilidade do fluxo das informações pela internet e de suas comunicações privadas armazenadas, condições estas que se aplicam ao uso do WhatsApp.

Texto da advogada trabalhista Lilian Duarte Bicalho