Tema recorrente nas eleições das últimas duas décadas, a necessária reforma tributária jamais foi tratada com seriedade por candidatos a presidente da República ou por presidentes eleitos. Quando, durante a campanha, são chamados a tratar do tema afirmam que é prioritário e que será objeto de proposta a ser apresentada nos seis primeiros meses seguintes à posse. Fato é que jamais conhecemos detalhadamente qual seria a reforma tributária pretendida por quaisquer dos candidatos e proposta alguma chegou a ser levada à apreciação do Congresso Nacional pelos eleitos.
Por isso, temos um sistema tributário disfuncional, oneroso e injusto, que acaba por impedir o desejado desenvolvimento econômico que elevaria o Brasil do eterno patamar de economia emergente para o grupo das nações desenvolvidas.
A disfuncionalidade apresenta duas faces. Por um lado, o grosso da arrecadação tributária está concentrado na União, que cada vez mais se vale de impostos disfarçados de contribuições sociais para carrear recursos para seus cofres, restando aos estados e municípios a arrecadação do ICMS, IPTU e ISSQN, além das transferências obrigatórias constitucionais, que a cada dia representam menos no total arrecadado. Tal estrutura tributária põe em xeque o princípio federativo, porque estados e municípios têm cada vez menos recursos para prestar os serviços públicos que lhes competem, ficando à mercê de favores da União para equilibrar seus orçamentos. De outro, a maior parte da arrecadação provém de impostos indiretos, incidentes sobre o consumo, o que acaba por fazer com que as classes menos favorecidas paguem proporcionalmente mais tributos que as mais abastadas. Além de socialmente injusto, esse modelo de tributação trava o crescimento econômico na medida em que reduz a capacidade de consumo dos mais pobres, com óbvios reflexos negativos sobre o setor produtivo.
O sistema tributário em sua atual configuração é oneroso para o contribuinte, porque está assentado numa multiplicidade de impostos, contribuições e taxas cuja administração exige vultosos investimentos privados necessários ao cumprimento de vasta burocracia, prevista num cipoal de leis, decretos, instruções normativas e portarias, de impossível observância sem que se tenha toda uma dispendiosa estrutura montada para esse específico fim.
Como adiantado linhas acima, a injustiça, que anda de mãos dadas com a ineficiência econômica, está em preferir a arrecadação via impostos indiretos, incidentes sobre consumo, à arrecadação por meio de tributos incidentes sobre a renda e a propriedade. Tal opção implica na regressividade do sistema tributário, na medida em que as classes menos abastadas contribuem proporcionalmente com a maior parcela do todo arrecadado. Com menos dinheiro no bolso, deixam de consumir bens e serviços que impulsionariam o crescimento econômico pelo aumento da demanda e, consequentemente, da produção.
Passa da hora da sociedade brasileira, independentemente de ideologia e preferência política, exigir de nossos governantes que promovam a reforma tributária que leve a uma forma mais justa e eficiente a tributação, de modo que, sem aumento da carga tributária – que se aproxima de 40% do PIB –, tenhamos um país socialmente justo e economicamente eficaz, como tantos há por aí com carga tributária equivalente. Trata-se de questão de qualidade, não de quantidade.
Texto de Nelson Damasceno
Advogado Tributário